Após a consolidação da demanda interna, as indústrias produtoras de biodiesel preparam terreno para avançar rumo ao mercado internacional a partir do próximo ano.
O Programa de Biodiesel recebe hoje a atenção de cinco ministérios - Casa Civil, Agricultura, Desenvolvimento, Minas e Energia e Desenvolvimento Agrário - que estudam a criação de mecanismos de compensação tributária interna para impulsionar os primeiros embarques. O objetivo é se antecipar à demanda prevista com as metas para o aumento da mistura de biodiesel ao diesel traçadas pelos países da União Européia (UE) e pelos Estados Unidos.
Em 2010, de acordo com as últimas projeções realizadas pelo Food and Agricultural Policy Research Institute (Fapri), o consumo de biodiesel na UE deve chegar a 2,209 bilhões de litros, com uma produção interna da ordem de 1,8 bilhão de litros, o que resultaria num mercado potencial de 352 milhões de litros.
No mesmo ano em que os principais mercados globais do Setor irão ampliar consideravelmente sua demanda, passará a funcionar no Brasil a maior usina de biodiesel do mundo, com produção totalmente voltada ao mercado externo.
A Companhia Brasileira de Energias Alternativas e Renováveis (CBEAR) investirá 300 milhões de euros na construção da planta, que terá capacidade para produzir até 600 mil toneladas de biodiesel por ano.
O empreendimento está previsto para começar a funcionar em fevereiro de 2010 já utilizando toda a sua capacidade instalada. Para isso, a Companhia irá contar com um celeiro produtivo que abrange uma área de 68 municípios localizados na região Centro-Sul no Paraná, estado escolhido por dispor de boa infraestrutura logística e agrícola.
Novas matérias-primas
Segundo a diretora-executiva da CBEAR, Christianne Fullin, os contratos de fornecimento com produtores já foram firmados e mais alguns estão para ser fechados. “Primeiro pesquisamos o interesse do agricultor, depois procuramos uma janela agrícola, para poder trabalhar com culturas de inverno, como girassol e canola, que serão as principais matérias-primas já a partir do segundo ano de funcionamento”, disse. No primeiro ano, a soja será a principal matéria-prima em razão do volume e escala já existentes.
Contratos de exportação
A ponta compradora também está garantida. Praticamente sem ter saído do papel, a empresa já conseguiu firmar contratos de exportação - feito inédito entre as empresas já em funcionamento. O nome do importador será mantido em sigilo até primeira remessa, em razão de uma cláusula do contrato.
Grande parte do diferencial da CBEAR, que permitiu sua entrada em um mercado em que as outras empresas nacionais do setor ainda não conseguiram penetrar, é a adequação do produto às exigências dos consumidores internacionais. Exigências essas que não estão diretamente ligadas à inovação, mas à responsabilidade social e ambiental.
Segundo Christianne, as perspectivas para o setor são positivas e as empresas brasileiras devem ficar atentas a novos mercados que estão surgindo. “O mercado externo tem necessidade do produto e está aberto a negociações“, avalia. “Antes mesmo de entrar em funcionamento, já vamos começar a ver alguma coisa no mercado spot”, revela, indicando oportunidades de vendas pontuais no mercado.
A produção da CBEAR irá começar a partir de uma única planta integrada, mas a empresa já está prospectando negócios em outras regiões do Brasil onde poderão instalar novas plantas futuramente.
Excedente exportável
Ter um excedente para exportação não será problema para o Brasil avançar no comércio mundial de biodiesel. De acordo com o presidente da União Brasileira do Biodiesel (Ubrabio), Odacir Klein, as usinas que atualmente atendem a obrigatoriedade da adição de 3% do biocombustível ao diesel (mistura chamada de B3) têm plenas condições de atender a uma demanda interna para o B5, com 5% de biodiesel no diesel. “Hoje as usinas poderiam colocar no mercado até 3 bilhões de litros por ano, enquanto que a demanda pelo B3 é de 1,4 bilhão de litros”, diz Klein. Com o B5, que passará a ser obrigatório em 2012, a demanda interna será de cerca de dois bilhões de litros.
O presidente da Oleoplan, Irineu Boff, é um dos que defendem abertamente a adição de 5% já a partir de janeiro de 2009. “Há um grupo grande de empresas que esse ano demonstraram claramente ter condições de atender a uma demanda firme”, avalia.
Por pressão das indústrias, com capacidade ociosa, o setor dá como praticamente certo que o governo aumentará a obrigatoriedade de mistura de biodiesel para pelo menos 4% do diesel em 2009. A Oleoplan é uma das indústrias do setor que apresentaram maior crescimento em 2008. Até setembro a produção da usina já havia superado em oito vezes o volume do ano passado.
Concorrência argentina
Mesmo conquistando espaço no mercado interno, Boff admite que é difícil conseguir vender para o exterior. “Sempre tem um argentino para vender mais barato”, brinca. A Argentina é o maior algoz do Brasil na competição por mercados. Com um sistema de tributação diferenciado para matéria-prima e industrializados, que valoriza o produto com valor agregado, ela garante um ganho adicional ao produtor por meio da proteção fiscal. Os produtores argentinos conseguiram elevar a receita dos embarques de US$ 135 milhões para US$ 264 milhões só no primeiro semestre de 2008.
A previsão é de que eles possam encerrar o ano com um faturamento de US$ 584 milhões, segundo a organização Investigações Econômicas Setoriais (IES). A capacidade de produção do país é de 800 mil toneladas por ano.
Priscila Machado